Hague Talk – Patrick Noordoven – 19 Setembro 2014

Vou contar como fui privado do direito humano à identidade e informar vocês sobre as consequências dessa violação de direitos humanos.

Crescí sem saber que fui privado do direito humano à identidade mas durante o processo de minha “adoção” ilegal no Brasil, pouco tempo depois do nascimento, minha identidade me foi tirada deliberadamente. Não sou o único afetado, isso aconteceu com muitos bebês no Brasil.

No ano 1981 a polícia holandesa iniciou uma investigação criminal internacional de adoções interestaduais ilegais do Brasil. Estas investigações – oficialmente conhecidas como Brazil Baby Affair – revelaram adoções ilegais do Brasil para vários países europeus e para os Estados Unidos. Resumidamente, o Brazil Baby Affair privou intencionalmente esses bebês do direito humano à identidade, sempre procedendo da mesma maneira no mesmo país no mesmo período de tempo.

Os resultados da investigação na Holanda representam somente uma pequena parte do escândalo, só expõem um exemplo. Obviamente demostram que – ao menos – dúzias de bebés brasileiros foram adotados ilegalmente.

Na maioria dos casos na Holanda, os pais adotivos confessaram-se culpados de ações que constituíram uma privação do direito humano à identidade porque registraram os bebês brasileiros como filhos biológicos deles. Algumas das mães embarcaram no avião com barrigas falsas, fingindo estarem grávidas. Os demais ficaram pouco tempo no Brasil, fingindo o estágio final de gravidez e que o bebê tivesse nascido durante férias no Brasil. Com o registro do bebê brasileiro como próprio bebê, eles extinguiram todas as referências à identidade original do bebé.

Saber que eu tinha sido adotado provocou em mim uma sensação de ser truncado de uma parte de mim, das minhas raízes. Primeiro não fiquei preocupado com o impacto que isso teria em mim porque sempre acreditei que podia buscar minhas raízes no Brasil quando decidisse estar disposto a faze-lo. Não estive até me tornar um jovem adulto, então comecei com a busca e descobri que fui adotado ilegalmente. Nunca na vida tinha suspeitado disso.

Ao completar 21 anos de idade, me tornei disposto a buscar minhas raízes. Com a busca de minha identidade começou uma viagem que ia modificar toda a minha vida. Quando mostrei a meus pais adotivos o bilhete para o Brasil que tinha comprado, eles me disseram que não podia buscar a minha identidade porque não tinham informações disponíveis.

Não obstante, retornei ao Brasil sem nenhuma informação sobre minha identidade. Fiquei chocado quando descobri que a data de meu nascimento foi engendrada. Meus pais adotivos sempre esconderam essa informação determinante de identidade até o momento que embarquei no avião. Depois de que me tinham contado que não existia nenhuma informação sobre minha identidade original eles me disseram que não lograria nada com a minha busca porque até minha data de nascimento era falsa.

Comecei a busca baseada numa falsa identidade porque meus pais adotivos me registraram oficialmente como filho biológico deles, tanto no Brasil como na Holanda, e não como filho adotado. A consequência disso era que eu não sabia quando e onde nasci, para já não falar de quem era minha mãe. O único indício que tinha era o fato que devia ter nascido em São Paulo. Por isso comecei a buscar numa cidade com mais habitantes que toda a Holanda, sem qualquer tipo de informação.

Não sou crente, mas estava sempre totalmente convencido de uma circunstância particular que me levou permanentemente a continuar a busca. O que me impulsionou era o fato de que eu não tinha caído do céu! Procurei uma agulha no palheiro, ainda sem saber qual palheiro devia procurar. Minha busca tratava de encontrar lugares de nascimento possíveis, de uma data de nascimento incerta como data de nascimento possível e o peso de nascimento possível. Voltei para o Brasil varias vezes para continuar a busca.

Em 2010 comecei a perceber que as pessoas responsáveis por minha adoção ilegal me forneceram permanentemente falsas informações sobre o que supostamente tinha acontecido. Durou mais que dez anos para juntar as peças da verdade e para desenvolver um cálculo de que na realidade tinha acontecido. Mais que 10 anos! Quando finalmente cheguei no fim da busca, depois de haver procurado dúzias de mães possíveis, confrontando centenas de mulheres com o mesmo nome, me encontrei com a filha da última mãe possível que sobrava das pessoas que estava buscando. Era muito difícil encontrá-la mas quando a encontrei ela me contou que sua mãe tinha falecido no ano 1985. Ela sabia que deveria ter um irmão mais novo do qual ninguém sabia o que lhe tinha passado.

A análise DNA confirmou inequivocamente que tínhamos a mesma mãe. Finalmente a tinha encontrado mas tarde demais.

Como consequência disso agora ainda tenho que procurar meu pai. Ninguém sabe quem poderia ser, só minha mãe me poderia ter contado quem era com certeza. Ainda estou procurando meu pai e sua família. Depois de buscar minha mãe falecida, passei dois anos de luto e reflexão. Durante esta época finalmente entendi a natureza e as implicações de minha adoção ilegal. No ano passado fui capaz de começar com uma profunda reconstrução de minha adoção ilegal.

Desde 2011 eu fui capaz de reconstruir minha identidade verdadeira e o que aconteceu depois de meu nascimento devido às investigações e entrevistas que fiz pessoalmente e por investigações a nível internacional. Não só descobri o que aconteceu no meu caso mas o que tinha acontecido essencialmente e em geral nos outros casos que formam parte do Brazil Baby Affair – o nome oficial das investigações policias da adoção ilegal no Brasil. Com 15 anos de experiência, decidi que numerosas vítimas poderiam usar meu apoio. Com este propósito, eu fundei a ONG Brazil Baby Affair, que foi o nome das investigações policiais oficiais à respeito de adoções ilegais feitas no Brasil.

Através da ONG continuarei investigando e começarei a informar o mundo sobre o Brazil Baby Affair. Consequentemente vou aproveitar do empenho que já fiz durante a busca de minha identidade que ainda continua. Por fim, estou pondo minhas experiências de buscar minha família em prática para ajudar outras pessoas de maneira construtiva para poder seguir à diante.